Durante meus anos lidando com a obesidade, atuando como psicóloga e observando a vida ao meu redor, deparei-me com uma frase recorrente entre aqueles que buscam emagrecer ou transformar seus estilos de vida: "vou pegar gosto por isso". É compreensível que alguém comece a realizar atividades das quais não desfruta inicialmente, como exercícios físicos ou consumo de frutas e saladas, na esperança de que, com o tempo, cultive um genuíno interesse por essas práticas, transformando-as em hábitos. Em outras palavras, a dificuldade inicial de superar a falta de vontade é encarada como passageira, uma vez que se adquire gosto pelo que se está fazendo.
Entretanto, o oposto dessa expectativa é igualmente verdadeiro. O processo de "desenvolver afinidade" pode nunca se concretizar, tornando-se assim um motivo para desistência ou falta de perseverança.
Em nossa cultura, somos frequentemente incentivados a buscar aquilo que nos traz prazer e satisfação. No âmbito profissional, por exemplo, é comum ouvir frases que enfatizam a importância de encontrar propósito, como "faça o que ama e você não trabalhará um dia na sua vida". No contexto da busca por um estilo de vida saudável, somos encorajados a persistir até que nosso cérebro libere endorfina, proporcionando-nos uma sensação de prazer e felicidade. Mensagens constantes nos incentivam a satisfazer nossos desejos imediatos e encontrar contentamento em todas as áreas de nossas vidas. À medida que nos deixamos levar por essa busca incessante por satisfação, tornamo-nos cada vez mais intolerantes ao sofrimento ou desconforto.
Essa mentalidade é como uma receita para a frustração e a ansiedade. Quando acreditamos que devemos encontrar prazer em todas as áreas da vida, perdemos a disposição para enfrentar qualquer coisa que contradiga essa premissa e acabamos desistindo facilmente e evitando as mudanças necessárias.
No entanto, a realidade é que não podemos fazer apenas aquilo que gostamos, e nem sempre conseguimos gostar de tudo o que fazemos. E isso é perfeitamente normal. É uma das verdades fundamentais da vida, e quanto mais nos acostumamos com essa ideia, mais capazes nos tornamos de lidar com as frustrações e de fazer escolhas mais acertadas.
Esperar "pegar gosto" pelas coisas pode ser uma armadilha perigosa, pois nos coloca diante da possibilidade de um grande "NÃO": talvez você nunca vá gostar do que está fazendo, mas precisa fazê-lo mesmo assim. E você terá dificuldades para lidar com isso enquanto sustenta a pretensão de fazer o que gosta ou aprender a gostar.
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